Pela defesa dos direitos digitais em Portugal




Em Junho de 2021, a Comissão Europeia procurou saber a opinião dos vários Estados-Membros da União Europeia sobre a retenção de dados de localização, de tráfego, de endereços de IP, entre outros. Para isso, enviou aos países um documento [PDF] com várias questões e três propostas passíveis de serem seguidas pela Comissão Europeia. Segundo a StateWatch, sete países aceitaram publicar as suas respostas ao questionário - Dinamarca, Finlândia, Alemanha, Hungria, Luxemburgo, Países Baixos e Suécia - cujas posições podem ser lidas neste artigo. Houve ainda 13 países que recusaram publicar essa informação, entre os quais Portugal.

Desde Fevereiro passado que a D3 tem estado a tentar obter a resposta de Portugal a este questionário da Comissão Europeia, junto do Gabinete do Ministro de Estado e Negócios Estrangeiros, sem sucesso. Os pedidos realizados por email devolveram uma mensagem de que foram lidos, mas nunca obtivemos qualquer resposta.

Fazendo uso da Lei de Acesso aos Documentos Administrativos (LADA), abrimos um processo junto da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA), que culminou no Parecer n.º 237 de 15/06/2022 [PDF], favorável ao pedido da D3. Nesse parecer, é sublinhado que o Ministro de Estado e dos
Negócios Estrangeiros nada disse quando convidado pela CADA a pronunciar-se e conclui que "deverá ser cumprido o direito de acesso, no quadro exposto.".

Mesmo depois do parecer da CADA ser publicado, voltámos a contactar o gabinete Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, recebendo novamente uma mensagem confirmando a leitura do email, mas mais uma vez sem qualquer resposta. O Ministério ignorou igualmente a CADA, que é uma entidade administrativa independente que funciona junto da Assembleia da República.

A LADA tem algumas exceções, que as entidades podem usar para restringir o acesso aos documentos, como por exemplo documentos nominativos, e outras, que não parecem aplicar-se a este caso, atendendo à natureza das questões. Contudo, ainda que a resposta de Portugal tivesse informação sensível, esta poderia ser redactada e o Ministério deveria justificar a não disponibilização da informação pedida. Mas nada disto foi feito.

Esta posição é inaceitável. É uma medida de transparência básica dar a conhecer aos cidadãos quais as posições assumidas pelo Estado Português na União Europeia.

 

Nota: A propósito dos metadados, esta semana o Tribunal de Justiça da União Europeia declarou a ilegalidade da lei de retenção de dados francesa e da nova lei de retenção de dados alemã. A lei alemã era bem mais estrita que as propostas em discussão na Assembleia da República e mesmo assim caiu, por não respeitar a jurisprudência europeia. Por cá, continuamos a ouvir o mesmo choro e hipérboles catastrofistas de sempre, de quem optou por fazer vista grossa às decisões do Tribunal de Justiça da União Europeia desde 2014 e inexplicavelmente continuou a recorrer a prova indevida, até à intervenção do Tribunal Constitucional.
Apelamos a que a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias oiça antes especialistas deste tema - sabemos de pelo menos três Universidades portuguesas com Professores nos seus quadros que estudaram o tema do ponto de vista jurídico e podem falar com propriedade sobre o assunto. Sob pena de, a continuarmos neste registo, a dúvida será se a nova lei, a ser aprovada no Parlamento, cai primeiro no Luxemburgo ou no Palácio Ratton.